22 agosto 2008

Descrição de um prazer

Acabei de saborear um trago de água tónica.

Apercebi-me de que era líquida, espumante, borbulhante, ácida, amarga, não como um limão porque não é leitosa, mas mais transparente, mais azeda e mais doce, muito expansiva, enquanto se mistura com a saliva e dança entre o palato e a língua.

Ao dividir-se em infinitas partículas dentro da minha boca, deixa de ser líquida.

Por fora, também é um pouco assim: se a despejo num copo, inicia um marulhar veloz e lento: nem uma gota de água cai no copo, é apenas espuma que se alastra e transborda.

A sua forma é como a daqueles líquenes que se propagam em sopros pelos corpos impolutos.

A cor é amarela, verde e castanha, com uma ponta de negro.

O seu grau de transparência sofre várias metamorfoses: começando por ser total dentro da garrafa fechada, torna-se opaca ao cair no copo, depois translúcida, e novamente transparente quando se acalma.

Se entra na minha boca, fica granulosa e dispersa, flutua e penetra em todos os vasos e mucosas, infiltra-se no istmo da garganta e daí escorrega até ao estômago, mas, nesse momento, já é um gás leve e espesso.

A água tónica é um bálsamo para a minha boca.

Quando penso nela, desejo-a... quero bebê-la! e sentir o Prazer Supremo ¾ entre o momento em que se expande e aquele em que cai, deixando o seu sabor indescritível incrustado no meu espírito.

 

 

1991

1 comentário:

  1. Olá, Maria Papoila
    Não percebi o teu novo blog, «esperimental»
    Bem, li com atenção o teu post e como depois de resolver alguuns problemas poderei «gozar» da liberdade de «reforma», pensei que talvez pudesse ser interessante pegar nas «Campanhas de alfabetização» e na documentação que referes. Poderia ser que dali conseguíssemos fazer nascer uma obra ou deixar que os testemunhos se não percam de todo. Que dizes?
    Bjo
    VM

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