12 agosto 2008

Mão-árvore

 Mão-árvore,

agitas-te quanto podes:

revolves... revolves... revolves...

a terra em volta das raízes.

Mão aberta,

tronco vermelho de desejo,

dedos longos... longos... longos...

ramos espreguiçados mais... e mais...

aspirando o além-espaço.

Mas mão-árvore!...

Raízes-cérebro!!

A árvore seca se as raízes cortarem,

a mão murcha se o cérebro morrer,

mas mão-árvore não quer ficar presa.

Mão-árvore

hoje olhou para baixo

e viu-se presa à terra

_ amarrada até pelo ar _

e a amargura secou os seus lábios,

os seus olhos entristeceram,

o corpo inteiro chorou.

Isto passou-se num dia de trovoada

e só a sua alma sentiu a condenação

a prisão perpétua.

Mas não se afogou a mão-árvore,

continua procurando... procurando...

procurando... talvez destruir-se,

pois o seu maior desejo é voar

sem algemas nas raízes.

 

Explicação da mão-árvore

Nascem em terra vermelha e de nove em nove anos choram debaixo do Sol abrasador de Agosto. Porque os homens, sem dó nem piedade, arrancam-lhes a pele com um machado. Árvores que são corpos em carne viva e ao mesmo tempo mãos presas à terra (cinco ramos como cinco dedos). É impossível um alentejano não as adorar.

E eu sou um sobreiro preso à terra que procura libertar-se das algemas raízes, que quer talvez destruir-se, pois o seu maior desejo é voar, conhecer e amar tudo.

Presa à terra, e também com claustrofobia da atmosfera, nem o desejo que retorce os ramos e os troncos vermelhos impõe limites à conveniência da razão. A mão-árvore não se afoga em lágrimas, apesar da amargura visível nos lábios, da infinita tristeza nos olhos, de toda a agitação e procura do êxtase no além-espaço. A terra impõe-me o florescimento da rude inteligência. Por isso continuo a equilibrar-me, qual funâmbulo, num arame incerto. Protegida, contudo, pelas tais raízes que me limitam os voos (mas não os sonhos). Com os ramos espreguiçando-se, sempre mais e mais, a consciência e a vontade de chegar aonde nada seja apenas nada e tudo exista como realidade, sem os abismos desta vida que nos nossos dias replica o prolongamento das regras convenientes, será que um dia acharei o meu lugar mágico?

 

Maio de 1981

Sem comentários:

Enviar um comentário

Arquivo do blogue