Este mundinho está irremediavelmente
povoado de vermes.
É impossível esquecer-me,
perdi
a esperança.
Todavia, ainda reparo nos rostos.
Aquele ali agarra-se à rapariga
como quem não passa sem doces
pra
estar aqui.
Perto de mim, uma jovem alastra
discrição para um rapaz ver
enquanto, em tom de engate,
ele lhe conta gracinhas do seu bebé.
O bicho à minha frente embriaga-me
com olhar de camponês mediterrânico,
reflexos de terra, barba de milho...
Parece um rico homem, atento e volúvel
como
todos os outros.
Portanto, sempre arranja desculpas
_afinal, não passa dum homem!
Voltando ao casal:
embora ela o despreze,
ele
persegue-a
nem que seja pra que ela veja
como as Parcas lhe cortaram as asas.
Quanto a mim, não sei
por que me olha aquele ali...
se fugi nos ponteiros de Cronos e agora
só escorro na tinta de uma caneta baça.
Irra, que gente mais aborrecida e delicada!
Olham uns pròs outros como quem se esconde,
pedindo desculpa antes de abrirem a boca
pra se
desculparem por existirem.
Se nem comem açordas por medo dos odores,
por que raio penso eu neles?!...
Só pròs insultar por serem insectos
calados no ruído de si mesmos?
Não sei por que me preocupo ainda com coisas
que, no fim da viagem, se depositam rotas
nas portas dos seus próprios pesadelos.
Ah, se ao menos soubessem amar uma
pedra!...
Lá bem no fundo, amam
os cascalhos que lhes soterram as barrigas.
Destemperada, sempre digo:
_e mais nada!!
Apenas vêem bem os olhos cerrados,
pois a mandíbula que tritura as espinhas
dos cavalos
(já cansados e abatidos nos combates da vida)
não pode dissipar a neblina que cai da
falsidade.
Então que siga a dança da guerra,
até à
queda na cova!
Mas, se o mundo se fecha
e o tempo prossegue indiferente,
não tarda choverão pedras
que, sorrateiras, se escoarão
para recomeço das tumbas.
Afinal, nem esta caneta baça me esclarece.
Continuo sem saber o que faço aqui:
_parece-me que vivo
só porque ainda vos vejo as sombras.
Mas também sinto que nenhum rio de ácidos
lavará a imundice que vos atrofia os
cérebros.
HCP,
14 Fev. 97